Como o resgate da tradição antiga trouxe o esporte mundial à modernidade
Os jogos olímpicos são uma tradição milenar, descobrimos tudo sobre sua história no meu último post. Mas como que ele conseguiu voltar ao calendário mundial e expandir de forma tão incrível?
Um dos principais (na verdade é o principal) nomes do movimento olímpico moderno é Charles Freddy Pierre, ou simplesmente, o Barão de Coubertin. Ele tinha uma visão muito clara: a educação do ser humano vai além do livro, ela também tem o componente físico. Coubertin acreditava que cuidar do corpo era tão importante quanto cuidar da mente.
Tendo essa visão, ele buscou inspiração nos Gregos antigos e seus jogos. Além da questão do estímulo à prática de exercícios, Coubertin também queria promover a paz entre as nações com o esporte. Em 1894, o Barão de Coubertin e seus apoiadores William Sloane e Charles Herbert, assinaram na frente de uma delegação internacional a criação do órgão que eventualmente se tornaria o Comitê Olímpico Internacional (COI).
Inicialmente, a primeira edição dos jogos seriam disputados em 1900 junto com a Feira Mundial em Paris. Os planos mudaram quando o príncipe Grego gostou tanto da ideia da volta dos jogos que conseguiu o país organizar em dois anos. Assim, em 1896 os primeiros jogos da era moderna foram ser disputados em sua terra de natal depois de 16 séculos!
Essa primeira edição na verdade não teve um forte impacto fora da Grécia. Participaram 13 países e 285 atletas, quase todos amadores, digo quase todos pois os atletas da esgrima eram profissionais. As modalidades presentes eram atletismo, halterofilismo, natação, ciclismo, ginástica, luta, esgrima e tênis. A inclusão dos atletas profissionais foi polêmica pois Coubertin acreditava que a essência dos jogos era que ele podia ser acessível para todos.
Se engana quem pensa que a influência grega se limitou aos jogos. A maratona foi criada especialmente para as Olímpiadas de Atenas de 1896 e foi inspirada no soldado grego antigo que correu de Maratona para Atenas para avisar seu rei sobre a vitória sobre os Persas.
Nesta primeira edição da corrida, a grande maioria dos participantes não conseguiu completar a prova pois a novidade das 25 milhas nunca havia sido testada neste nível antes. O grande vencedor foi o grego Spiridon Louis. Sua vitória na verdade foi uma boa surpresa para o público presente, considerando que ele não era um grande atleta antes disso e durante a corrida ele parou para comer um pão e tomar uma taça de vinho. Nos últimos metros até a linha de chegada, até mesmo o príncipe correu ao lado de Spiridon, levantando seus braços em comemoração.
Apesar de toda a sua visão de futuro e sua crença que o esporte é uma parte fundamental para o desenvolvimento humano, o Barão de Coubertin acreditava que o único papel que a mulher deveria exercer dentro do cenário olímpico era de bater palmas. Porém, mulheres começaram a participar cedo da programação esportiva com torneios exclusivos no tênis e no golfe ainda em 1900. Inicialmente, elas participavam em esportes considerados mais “femininos”, mas hoje possuem categorias em praticamente todas as modalidades, inclusive categorias exclusivas como ginástica rítmica e nado sincronizado.
As Olimpíadas de Atenas 1896 foram pequenas e com um reconhecimento muito mais dentro da Grécia como mencionei, mas rapidamente se tornou um evento esperado pelo mundo inteiro, tanto que os jogos de Estocolmo em 1912 já contava com atletas dos 5 continentes.
A primeira edição com a tocha foi Amsterdam em 1928 e em 1932, em Los Angeles, foi construída a primeira vila olímpica. Pode não parecer tanto, mas ter a vila permitiu que os jogos durarem até 18 dias. Com o passar dos anos, os jogos também foram ficando mais inclusivos e a primeira edição dos jogos paralímpicos ocorreu em 1960, em Roma.
Um momento importante para os jogos foi em 1984 em Los Angeles, quando o modelo de marketing usado até hoje foi desenvolvido. Foi aqui também que teve a inclusão de eventos exclusivamente femininos que mencionei anteriormente.
A edição mais recente dos jogos no Rio de Janeiro em 2016 também contou com um fato inédito, foi a primeira edição que teve uma delegação de refugiados. Esses eram atletas, que por algum motivo, não puderam representar seus países então representaram a bandeira olímpica.
OS SÍMBOLOS OLÍMPICOS
Um dos mais reconhecidos símbolos olímpicos é a sua bandeira. Ela foi apresentada pela primeira vez em 1914 pelo próprio Barão de Coubertin e foi uma maneira simples e de fácil reconhecimento para representar os cinco continentes nas cores azul, amarelo, preto, verde e vermelho.
O lema olímpico é outro símbolo importante para o movimento. Oficialmente ele é: ‘Citius, Altius, Fortius’, ou seja, mais rápido, mais alto, mais forte. Nos últimos anos esse lema tem sido um pouco de um ponto polêmico pois o que era para servir de inspiração para o atleta se superar, se tornou um “motivo” para usar substâncias proibidas.
Este próximo símbolo na verdade é um combo 2 por 1. Estou falando da tocha e de seu revezamento. Embora pensamos que esta pode ser uma tradição antiga pois a cerimônia no templo de Hera nos faz imaginar como seria na Grécia antiga, mas na verdade é algo do século XX mesmo. Veja, na época dos jogos antigos, não tinha necessidade de ter um revezamento pois toda edição era em Olímpia e participavam somente homens gregos.
Por último, um dos mais recentes fenômenos olímpicos são os mascotes. A primeira edição dos jogos a usar um esboço de um mascote foi durante as Olimpíadas de inverno na França em 1968. O primeiro mascote oficial foi Waldi, um dachshund (o conhecido cachorro salsichinha) criado para os jogos de Munique em 1972. Ele foi o primeiro a ser usado na comunicação e nos produtos oficiais. Desde então, os mascotes tendem a representar a fauna ou flora do país sede, no Brasil por exemplo, os mascotes Tom e Vinicius foram criados para representar toda a fauna e flora tão diversificada deste nosso lindo país.
QUAIS EVENTOS SE DESTACAM?
BERLIM 1936
Um dos acontecimentos mais antigos está relacionada a um momento complicado da história do século XX. Um pouco antes da Segunda Guerra Mundial, Berlim recebeu os Jogos Olímpicos e fazia parte dos planos de Hitler demonstrar além da força de seu país, aquilo que ele considerava a “superioridade da raça ariana”. Ele pensou que nada como o palco olímpico para ele demonstrar aquilo que acreditava, mas estava muito, muito errado. Durante a principal prova do atletismo, um americano, estrela da Universidade de Ohio e neto de escravos chamado Jesse Owens ganhou 4 medalhas de ouro. Ele foi campeão nas provas de 100 e 200 metros rasos, salto em distância e revezamento 4 x 100. Assim que ele tomou o seu lugar mais alto no pódio, Hitler abandonou a arena esportiva e se recusou a cumprimentar o novo campeão.
MÉXICO 1968
Outro ponto que posso mencionar foi a Olimpíada da Cidade do México em 1968. Agora veja, o que aconteceu nos jogos não foi um caso isolado, a década toda foi bem difícil. As ruas de Paris eram palco de protestos, a União Soviética invadiu a Checoslováquia, Nixon foi eleito presidente dos Estados Unidos iniciando uma série de eventos que levariam à Guerra do Vietnã e a AI – 5 era aprovada no Brasil. Ufa. Mas dois assassinatos tiverem um impacto muito forte, o do presidente John F. Kennedy e do pastor Martin Luther King Jr.
Era uma época de mudanças extremas e muito rápidas, muitos entendiam que fazer os Jogos neste momento e em uma cidade conhecida por sua desigualdade social era desnecessário. Poucos dias antes da cerimônia de abertura, houve uma série de protestos que foram repreendidos pela polícia local, o que causou ainda mais indignação. Esta olimpíada quebrou a ilusão de que as Olimpíadas estavam completamente por fora da política.
A política esteve presente no pódio olímpico mais uma vez e de forma bem emblemática no México. Os vencedores da medalha de ouro e bronze nos 200 metros rasos Tommie Smith e John Carlos, respectivamente, usaram o seu tempo no pódio para fazer um protesto. Eles levantaram uma mão com o punho cerrado, como a saudação do movimento negro da época. Foi um momento de muita polêmica e ambos os atletas foram suspensos.
MUNIQUE 1972
Os jogos Olímpicos modernos também tem seus episódios trágicos. Em Munique em 1972, membros do grupo terrorista Setembro Negro da Palestina invadiram o alojamento da delegação Israelense. Os terroristas estavam pedindo a liberação de 234 prisioneiros detidos em Israel em troca da vida das 11 pessoas que foram feitas reféns. Depois da recusa do governo em negociar, o grupo então pediu aviões e helicópteros para o seu transporte. O plano era arrumar uma emboscada no aeroporto, mas como sabemos, não deu certo. No final de toda a operação 11 atletas israelenses, 1 policial alemão e 5 palestinos perderam a vida.
MOSCOU 1980 E LOS ANGELES 1984
Agora podemos falar de um caso interessante, pois ocorreu em duas edições seguidas dos jogos. Em plena guerra fria tivemos jogos em “lados opostos” vamos chamar. A primeira destas edições foi em Moscou no ano de 1980 e teve o boicote total dos Estados Unidos e de alguns de seus aliados como o Japão, Canadá e a extinta Alemanha Ocidental. O boicote total que eu falo é que estes países não mandaram absolutamente nenhum atleta para a disputa. Países como Reino Unido, França e Portugal abriram para que os atletas pudessem tomar as suas próprias decisões sobre ir ou não a Moscow.
A edição seguinte foi em Los Angeles e foi a vez da União Soviética e de seus aliados não participarem da disputa. Além da União Soviética , países do leste Europeu e Cuba não mandaram delegações mas por uma coincidência, essa foi a primeira vez que a China (tradicional parceira da URSS) participou das Olimpíadas.
Como resultado, além da qualidade técnica inferior por causa da falta dos principais atletas do mundo, a audiência também sofreu.
Rio de Janeiro 2016
Claro que não somente de tragédia vive o COI e os Jogos Olímpicos. Uma grande novidade nas Olimpíadas do Rio 2016 pode oferecer um pouco de esperança a, infelizmente, um número cada vez maior de pessoas que se encontram como refugiados. Esta foi a primeira edição que permitiu a pessoas competirem não por países mas sim pela bandeira Olímpica em si.
O QUE PODEMOS APRENDER COM ESTA TRADIÇÃO ESPORTIVA MILENAR?
Podemos entender como o esporte é uma parte importante na vida de muitas pessoas, tanto atletas quanto espectadores.
Sabemos que os jogos também podem apresentar uma situação única, onde apesar dos atletas representarem seus países e sua história, é um momento de união onde os olhos de todo o mundo estão voltados ao evento. Você pode até falar que a Copa do Mundo também faz isso e que não há motivo para ter as duas competições tão grandes, mas me responda algo: se não nas Olimpíadas, quando poderíamos nos tornar especialistas em hockey sobre grama, ginástica ou badminton?
Devemos também estudar as Olimpíadas por sua estrutura de negócio. Fiz o paralelo com a Copa do Mundo no último paragrafo onde a FIFA dialoga com as entidades continentais e elas então conversam com as federações nacionais. Esta estrutura é simples de seguir pois é um só esporte. O COI precisa ter boas relações com federações e confederações de vários esportes em todo o mundo.
Acredito que o mais importante é que os Jogos Olímpicos simbolizam a importância que o esporte tem na vida das pessoas de todo o globo. É algo que une os povos e é um momento especial onde o amante do basquete pode aprender sobre a vela e o praticante de corrida acompanha uma prova de hipismo, ou seja, todos podemos ensinar e aprender sobre este maravilhoso mundo que é o esporte.